terça-feira, 17 de julho de 2012

Legião da Boa Vontade

6ª feira, entre as 21h30 e as 22h00, Saldanha, acabada de jantar bem, vejo uma carrinha a parar e dezenas de pessoas a formarem uma fila atrás da carrinha. Há um burburinho de vozes. Aproximo-me para perceber o que se está a passar. Aproximo-me mais e vejo uma fila interminável de pessoas a receberem sopa quente, pão e sumos. As pessoas vão dispersando e aconchegando-se num qualquer canto para comerem a sopa ainda quente. Das dezenas e dezenas de pessoas que ali formaram fila, podiam-se contar pelos dedos de uma mão os que eram sem-abrigo, ou que pelo menos tinham aspecto disso. Vi pessoas normalíssimas, educadas, a esperar ordeiramente pela sua vez de receber aquela refeição. Pessoas da idade dos meus pais. Pessoas da minha idade com filhos nos braços ou pela mão. Fiquei com ideia de que as crianças não se apercebem exactamente do que se está a passar, para elas é uma brincadeira, já se conhecem, encontram-se todas as sextas para comerem uma sopa com os amigos e brincarem um pouco. Pouco mais de 45 minutos depois as pessoas vão dispersando. A carrinha vai embora. Em poucos minutos deixam-se de ver pessoas. instala-se de novo um "silêncio", desta vez ensurdecedor para mim. Sinto um arrepio na espinha. Uma vontade enorme de chorar. Um misto de tristeza e de medo. Eram pessoas iguais a mim que ali estavam. Que um dia já tiveram emprego. Que um dia já tiveram uma casa própria. Que já tiveram mesas fartas. Que já deitaram, vezes sem conta, comida que se acaba por estragar no frigorífico, para o lixo. Pessoas com família. Pessoas como eu. É verdadeiramente triste e assustador. 


Os Senhores e Senhoras da carrinha são os voluntários da Legião da Boa Vontade que saem do Saldanha e se dirigem ao Marquês de Pombal, onde pelos vistos a história se repete. Próxima paragem, Campo das Cebolas, daí seguem para Santa Apolónia e finalmente Santos, já por volta das 2 da manhã.
Para muitas destas pessoas esta é a única refeição do dia.

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